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Relatórios


Dezoito anos depois do assassinato da líder sindical Margarida Alves, na Paraíba, o Tribunal do Júri da Comarca de João Pessoa absolveu, por 5 votos a 2, o latifundiário Zito Buarque. Margarida foi morta com um tiro no rosto na porta de sua casa e diante de seu filho de dez anos.

A impunidade no caso Margarida Alves

Evanize Sydow*       

José de Arimatéia Alves nunca mais vai se esquecer do dia 12 de agosto de 1983. Ele tinha apenas dez anos quando viu sua mãe, a líder sindical Margarida Alves, ser assassinada com um tiro no rosto disparado de uma espingarda calibre 12. Margarida – presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande, na Paraíba – estava na porta de sua casa. A cena do corpo de Margarida todo ensaguentado e jogado no chão perturba José Arimatéia há exatos 18 anos.

O algoz de Margarida era um homem encapuzado. Dos cinco acusados de serem os mandantes do crime, apenas dois foram julgados e absolvidos: Antônio Carlos Coutinho e José Buarque de Gusmão Neto, conhecido como Zito Buarque. Agnaldo Veloso Borges já faleceu e os irmãos Amaro e Amauri José do Rego permanecem foragidos.

O julgamento do latifundiário Zito Buarque, de 53 anos, após ter sido adiado por seis vezes pelo Tribunal do Júri da Comarca de João Pessoa, ocorreu no dia 18 de junho deste ano. Por 5 votos a 2, ele foi absolvido. Foram cerca de 12 horas de trabalhos. Ao ser dada a

sentença, o clima era de revolta e indignação entre os familiares de Margarida. Ao final, eles seguiram para a Praça João Pessoa, onde havia manifestação organizada pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura da Paraiba. O Batalhão de Choque foi mandado ao local e acompanhou de perto toda a movimentação. A irmã de Margarida, Joaquina Marinho, de 69 anos, chegou a dizer que já esperava pelo resultado.

A impunidade neste caso parece não ter pego ninguém de surpresa. A possibilidade de manipulação do júri não foi descartada pelo promotor Victor Granadero, já que o réu é pessoa influente na Paraíba. O juiz Leandro dos Santos foi escalado em caráter especial pelo Tribunal do Júri da Paraíba para este caso. Os jurados permaneceram de cabeça baixa enquanto era lida a sentença. Granadero relatou a preocupação com a possibilidade de manipulação do júri, além das ameaças sofridas pelas testemunhas. "Espero que o conselho tenha absolvido o réu com convicção e não por ter sido manobrado pelo advogado de defesa."

Na época de seu assassinato, Margarida denunciou a Usina Tanques ao Ministério do Trabalho. De propriedade de Zito Buarque, a usina foi acusada de abusos contra canavieiros e o descumprimento da legislação trabalhista.

No julgamento, Zito afirmou que não teve nenhum desentendimento com a líder sindical e que, inclusive, Margarida era correligionária política do usineiro Agnaldo Veloso Borges, sogro de Zito. As afirmações provocaram revolta entre os familiares da sindicalista.

Os advogados assistentes de acusação não puderam estar presentes no dia 18 de junho pois, na mesma data, acontecia o julgamento dos acusados no massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará. Apesar dos pedidos para a mudança da data, o Tribunal manteve sua posição. Os advogados fizeram um pedido de anulação do julgamento e aguardam a resposta da Justiça.

Com repercussão internacional, o processo Margarida Alves agora está na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Mesmo com a absolvição de Zito Buarque, a corte internacional permanecerá examinando o caso.

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* Evanize Sydow, jornalista e pesquisadora da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos

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